Cultura geral ou interesse pessoal?

A tão falada falta de cultura geral dos participantes da Casa dos Segredos trouxe de novo a público a questão da cultura dos jovens portugueses. A revista Sábado foi para a rua entrevistar universitários com uma lista de perguntas de cultura geral e o resultado é este:



Chocante? Vamos por partes. Em primeiro lugar, alguns dos intervenientes já se vieram manifestar contra a forma como foram retratados no vídeo pois, segundo eles, foram-lhes colocadas várias perguntas às quais responderam acertadamente, tendo aparecido na entrevista apenas aquela(s) que falharam. Na realidade, não deixa de ser suspeito que apareça apenas uma resposta ao símbolo químico da água, e que alguns dos jovens só sejam vistos uma vez no vídeo. Ora isto quer dizer que a entrevista que a Sábado levou a cabo tanto poderia servir para atestar a "ignorância" dos jovens como para confirmar um bom nível de cultura geral.

Posto isto, falta perceber o que é, afinal, "ter cultura geral". Na minha opinião o termo é utilizado de uma forma indiscriminada e o próprio conceito é demasiado vago.

Eu responderia sem dificuldade a cada uma das perguntas que vemos no vídeo, mas isso não quer dizer que me sinta orgulhoso disso ou que não falhasse outras igualmente "fáceis" que me colocassem. E há ainda a ter em conta o aspecto dos nervos do momento, que se comprovam em cada concorrente de concursos televisivos de cultura geral quando dizem que "eu em casa acertava as respostas todas, aqui não sei o que se passou...".

Quero com isto dizer que o que para mim é uma questão fácil, para o meu amigo pode ser difícil e isto não quer dizer, de maneira nenhuma, que a minha cultura geral seja melhor do que a dele.

Dirão que estes conceitos são básicos, que qualquer um deveria saber quem escreveu Os Maias ou quem pintou a Mona Lisa e eu tenho que concordar, mas respondo que para a minha evolução profissional nunca me serviu de nada saber isso ou o símbolo químico da água. A cultura geral de cada um é, em última análise, uma questão de auto-valorização, de interesse de cada indivíduo.

Era exactamente à questão do interesse pessoal que eu queria chegar: A internet é para mim simultaneamente a maior, mais marcante e mais perigosa invenção da História da Humanidade, pois o facto de termos acesso a cada momento e em qualquer lugar a toda a informação permite-nos guardar na memória "corrente" apenas o que nos interessa. Quando eu tinha 8 anos sabia os nomes dos 12 apóstolos de Cristo, e hoje sei três ou quatro - mas em 30 segundos dou essa informação completa... se for preciso.

Não tenho dúvidas de que os jovens entrevistados sabem, por exemplo, quem é o melhor futebolista português da actualidade, conhecem as melhores marcas de telemóveis, cervejas alemãs, marcas de tabaco de enrolar, consolas de jogos ou salas de chat na internet. Porque no dia-a-dia ninguém quer saber se eles conhecem o Marlon Brando ou o Leonardo da Vinci.

A cultura geral de cada indivíduo, no século XXI, está directamente relacionada com o interesse pessoal de cada um. Se a ideia é criticar, talvez se possam criticar os interesses e ocupações dos jovens de hoje em dia - agora, a sua cultura geral... isso é lá com eles!