Tomás recebeu o pai com uma euforia desmedida. Se havia algo em que Vânia nunca tinha falhado, tinha sido nas visitas de Tomás ao pai na prisão. Apesar da distância sentiam-se muito próximos, e era por demais evidente que Tomás gostava muito mais do pai do que da mãe. Aos seis anos já sabia bem com quem gostava de estar, e mudar-se de malas e bagagens para casa do pai era tudo o que ele mais queria.
Paulo morava num T3 com varanda, sétimo andar de um dos quatro prédios de um condomínio fechado com uma enorme piscina no centro. Tomás adorava a sua nova casa, tinha um quarto só para si e montes de jogos de computador para jogar com o pai e com amigos. Ele e Paulo passavam horas a jogar, a brincar, a dar mergulhos na piscina. Mas quando Tomás adormecia caía a noite, voltava na mente de Paulo a imagem do alemão, claríssima, com aquele sobretudo preto, o cabelo loiro impecavelmente penteado e a cicatriz na testa. Paulo não sabia como o encontrar, não fazia ideia por onde começar. Em todo aquele tempo tinha chegado à conclusão apenas que talvez fosse boa ideia consultar os registos do SEF e da Embaixada da Alemanha. Mas não foi preciso nada disto.
Numa destas noites, cerca de três semanas após Paulo sair em liberdade, o telefone tocou e Paulo soube de imediato que era o alemão do lado de lá da linha.
Trémulo, atendeu mas não conseguiu articular qualquer palavra. Após breves segundos, o alemão falou, com um sotaque carregado: "Fui o responsável pela tua libertação, pois também eu fui responsável pela tua prisão. Tenho pena de não o ter conseguido mais cedo, mas espero que ainda vás a tempo de encontrar o teu caminho e ser feliz. Essa criança merece-o e tu também. É parecido contigo."
A referência a Tomás fez Paulo estremecer profundamente. Encarou-a como uma ameaça que juntou ao desejo antigo de vingança e, sem hesitar, respondeu num tom nervoso mas firme: "Se pensas que te perdoo, estás enganado. Vou-me vingar de ti, nem que seja a última coisa que faço. E se tocas num fio de cabelo do meu filho, a minha vingança vai ser lenta e dolorosa!", Paulo nem sabia bem de onde vinha toda esta raiva. Fez-se um breve silêncio, seguido da fria resposta do lado de lá: "Tu escolheste este caminho. Assim seja. Não precisas de me procurar, eu vou ter contigo."
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